Desde que a IGN lançou a arte conceitual algumas semanas atrás, as pessoas realmente estiveram falando sobre isso. Tive muitos amigos pedindo versões limpas das fotos para usar como fundos de tela e coisas do tipo. É empolgante ver tal reação positiva a versões reimaginadas de velhos e em muitos casos queridos personagens (até vi um comentário de que alguém gosta da nova Lisa *engasga* mais que do projeto antigo!). Achei que seria interessante aprofundar mais em re-desenhar esses personagens e como eles saem da cabeça de alguém.
Antes de nosso time começar a produção de Silent Hill 0rigins alguns anos atrás, eu tinha jogado todas as iterações de Silent Hill até o momento, e os primeiros 2 títulos da série certamente deixaram uma impressão marcante. Naépoca eles me pareceram bem aterradores em muitos aspectos, não apenas na forma com a qual eles teceram as linhas da narrativa perfeitamente no tecido do mundo do jogo — muitos aspectos visuais contribuíram para essa estética, criando para o jogador uma jornada intensa, convincente e genuinamente opressiva através de uma série de aventuras psicologicamente perturbadoras.
Houve muitos motivos que contribuíram para essa atmosfera e senso de imersão — não apenas a qualidade gráfica dos personagens encontrados vagando pelas ruas da cidade. Evitando as normas universalmente aceitas na época, os "heróis" de Silent Hill eram falhos — eles eram fisicamente fracos, sem habilidades com armas de fogo, incertos dos eventos que se desdobravam ao redor deles e incapazes de manter qualquer semblante de controle quando tudo o que eles conheciam lentamente mas inevitavelmente espiralava-se na direção do inferno. Eles exibiam sem pudor sua fragilidade, seu medo da intimidade, sua raiva e confusão.
Eles eram, em suma, incrivelmente humanos. No mais forte desses personagens essa humanidade foi manifestada de uma forma palpável fisicamente — os pequenos detalhes e marcas do rosto, finos capilares azuis aparecendo fracamente por baixo de sua superfície, os tons e cores hiper-realísticos que mudam com as diferentes partes do corpo, todas assutis nuances e imperfeições combinam para imbuir o protagonista com uma credibilidade visual que os diferenciava de seus semelhantes.
Mesmo agora, o melhor do passado de Silent Hill mantém sua base firme contra as hordas de cidadãos genéricos, com pele de plástico e mandíbulas de boneco que povoam a imensidão de jogos contemporâneos, e particularmente os agora geralmente vistos heróis de "survival 'action/horror'", armados até os dentes com Uzis 9mm e RPGs e apenas esperando para explodir os miolos daqueles monstros, acompanhados por alguns coadjuvantes obrigatórios. Sem ofensas.
Devido às óbvias restrições técnicas do hardware do PS1, aqueles que não resistiram a um teste do tempo tão bem são aqueles do primeiro título da série — mas eles também são alguns dos mais ternamente lembrados — talvez até estimados — personagens da série. Então aqui estamos "reimaginando" eles.
Uma consideração inicial foi quanto das características dos personagens de Silent Hill 1 deveria permanecer nesse novo conto. Havia uma certa inevitabilidade de que alguns reagiriam adversamente a nós pisoteando essa relva sagrada mas, após alguma discussão, sentimos que uma reimaginação do primeiro capítulo da série também necessitava do mesmo approach com os personagens e então decidimos que ao invés de serem guiados pela nostalgia, os personagens deveriam ser adaptados para ajustar-se à história que queríamos contar, e não o contrário. É claro que isso não significava que estávamos abandonando completamente o que havia sido feito antes; há muitas instâncias onde os membros do elenco antigo retêm elementos de suas encarnações anteriores tanto em termos visuais quanto no que diz respeito às suas circunstâncias pessoais — alguns, é claro, aparecerão surpreendentemente diferentes. Muitas das características discutidas acima estão presentes nos personagens de Shattered Memories, embora algumas vezes de uma forma levemente mais sutil que nos títulos anteriores.
O processo começa com uma discussão entre os Chefes criativos no que diz respeito à natureza dos personagens — seu papel na narrativa, o tipo de pessoa que eles são e como eles podem influenciar os aspectos psicológicos do jogo. Debatemos como eles devem reagir em diferentes circunstâncias (e também como suas versões alternativas reagem às mesmas circunstâncias), a cor de seus cabelos, a cor de seus olhos, a cor de sua pele, seu senso de moda (se, de fato, eles tiverem algum), etc., etc., até termos uma idéia bastante boa de quem é cada personagem.
Dessa discussão Sam produz um resumo escrito do personagem, acompanhado por uma folha de imagens de referência para servir de inspiração para seu rosto, cabelo e estilo de roupa. Uma vez que concordamos com o conteúdo disso, é submetido a Tomm para aprovação e então o processo de desenvolvimento começa...
O primeiro estágio é a produção da arte conceitual. Trabalhamos muito próximos com um time de artistas e tentamos nesse estágio produzir um conjunto de imagens que capturasse a essência de cada personagem, algo para servir de inspiração para nossos artistas ao invés de uma simples fotocópia.
Começando com uma série de rascunhos a lápis, cada personagem desenvolve-se através de uma série de estágios re-iterativos, gradualmente refinando os detalhes dos personagens até alcançarmos um ponto onde concluímos que capturamos algo da essência do personagem. O estáfio dinal é a produção de uma série de retratos detalhados de cada personagem, alguns dos quais foram recentemente liberados na Internet.
Quando uma parte do trabalho conceitual está completa começamos a produção dos modelos 3D reais. Desde o início a criação dos personagens para esse projeto foi uma tarefa considerável — não apenas pelo número de personagens dos quais precisávamos e da ênfase em produzir alta qualidade, mas também porque todos os personagens tinham várias variações — a maioria delas tão diferentes que eram efetivamente um personagem completamente novo — aumentando substancialmente a carga de trabalho (e pressão) no time dos personagens. Felizmente eles estavam aptos ao desafio.
Foi muito importante para nós, e para a narrativa, que o elenco de Shattered Memories viesse a ser convincente como pessoas reais (embora alguns deles ocasionalmente exibam um certo comportamento surreal), então uma quantidade satisfatória de tempo, pensamento e esforço foi colocada na criação dos personagens in-game.
Queríamos garantir que todos os personagens tivessem um alto nível de detalhe poligonal e textural, algo que geralmente parecia estar faltando no Wii, e os resultados finais foram alcançados através de uma combinação de arte 2D e modelagem 3D. Embora tenhamos decidido contra tentar implementar detalhes mapeados normalmente nos personagens (o Wii não suporta isso nativamente, e todos os outros processos técnicos ocorrendo no momento da renderização indicavam que estávamos levando o hardware um pouco longe demais), todos os personagens foram criados parcialmente em pacotes de modelagem 3D, nos permitindo criar um alto nível de detalhes 3D e então projetar os detalhes de luz e sombra nos mapas de textura para um nível coerente e realista de detalhes. O modelo 3D in-game foi então modificado para adicionar relevo extra a esses detalhes.
A maior parte de um personagem é sempre o rosto. Na natureza nenhum rosto humano é inteiramente simétrico, e esse é um dos aspectos da arte em jogos que geralmente é deixado de lado — o artista modela metade do rosto, o texturiza e então inverte tudo — enquanto isso pode ser tecnicamente e visualmente satisfatório, tal trabalho tem algo levemente irreal. Não em Silent Hill. Mantendo a tradição da série, o elenco de Shattered Memories exibe as pequenas falhas e nuances e detalhes assimétricos que adicionam um nível sutil de realismo que pode não ser imediatamente aparente, mas adiciona à credibilidade do personagem.
É claro, o rosto não trata apenas de como ele parece, mas como ele se move. Todos os detalhes no mundo são desperdiçados se ele não puder executar mais que alguns movimentos faciais robóticos. Investimos muito tempo na criação de animações faciais dos personagens (uma tarefa nada simples considerando o grande números de cenas — muitas das quais têm várias variações), e novamente adicionamos muitos movimentos assimétricos para garantir que um número de expressões humanas convincentes pudesseser alcançado.
Um dos outros detalhes com o qual fiquei satisfeito foi a forma com a qual criamos e renderizamos o cabelo. Conseguir que camadas de transparência sejam desenhadas na ordem certa, o que é conhecido como "alpha sorting", é um dos bichos-papões tradicionais da renderização em tempo real de jogos, então fiquei satisfeito em Shattered Memories porque conseguimos alcançar uma solução muito mais compreensiva para o cabelo dos personagens, com camadas de semi-transparência renderizadas sem defeito uma sobre a outra. A aparência é particularmente boa quando projeta sombras leves sobre os rostos dos personagens.
O desafio de pegar esse elenco de personagens e apresentá-los e um novo contexto foi um dos que nosso time de arte, ciente do legado da arte de alta qualidade dos personagens, estava ansioso para pegar, e provou ser uma experiência difícil mas muito recompensadora. Esperamos que os jogadores achem o jogo tão recompensador quanto e que gostem de nossas interpretações desses personagens — qualquer que seja o que eles venham a encontrar...