"Eu não sei o porquê mas eu amo este lugar, é tão calmo. James… prometa que vai me trazer aqui de volta…"
E ele me trouxe de volta! E como trouxe! Silent Hill 2 é o remake que todos duvidaram ser possível, duvidaram da sua capacidade de reinventar um clássico dos jogos de terror. Não só reinventou com maestria o que pra mim, o que vos fala, é o meu jogo de terror favorito da vida, como conseguiu se manter extremamente fiel à obra original e ainda homenagear um clássico.
Silent Hill 2 não é só um remake de peso, mas é também uma carta de amor aos fãs, tanto os mais antigos, quanto os que estão apenas começando suas jornadas pela cidade enevoada.
A seguir detalharei toda minha primeira experiência com o remake e minhas considerações, jogando pelo Playstation5.
Sem mais delongas, vamos à análise:
SILENT HILL 2 REMAKE
por InkRibbon, em 21 de março de 2025
"Eu não me importo se a cidade é perigosa, eu vou de qualquer maneira!"
Assim como nada vai parar James de reencontrar sua falecida esposa, nada parou o Bloober Team de fazer o que até hoje, é o melhor trabalho do estúdio.
Se por um lado todos estavam temerosos com o que o Bloober faria com o remake, muita gente simplesmente esnobava o estúdio, alegando que eles não teriam a capacidade de lidar com uma prova de fogo como essa, que é simplesmente refazer o 'melhor jogo de terror de todos os tempos'.
Eles já agregam um catálogo de peso no mercado de jogos de terror com suas ambientações fantásticas, trilhas impecáveis e ideias loucas e criativas que funcionam perfeitamente para o gênero. Mas onde a Bloober Team mais tem complicações é no gameplay. Com seus jogos sendo quase todos em primeira pessoa, fazer um remake com câmera em terceira pessoa 'over the shoulder' foi claramente um desafio. Somado a isso a exploração de uma cidade completamente erradicada pela solidão dos traumas de seus visitantes sem ser vazia. Eles tinham que fazer todas as peças do quebra-cabeças encaixarem sem deixar pontas soltas.
E o trabalho foi magnanimamente feito. Seja nos sons ambientes perfeitos de arrepiar a cada esquina ou nas sombras monstruosas espreitando na névoa densa, Silent Hill 2 não vai te deixar respirar. Com certas ressalvas de otimização como frames caindo em certas partes da cidade ou alguns artefatos de imagem como serrilhados e granulados na renderização dos personagens e cenários devido ao trabalho com iluminação volumétrica na Unreal Engine 5 (algo que já estamos carecas de saber que é da própria engine) o jogo é primoroso em todos os aspectos. Nas texturas perfeitas contrastando na bela e urbana cidadezinha de interior com os corredores decrépitos caindo aos pedaços dos cenários interiores. Graficamente, o remake dá um show de visuais. Arrisco até dizer que é um dos melhores que já vi no gênero.
Várias vezes me peguei passando horas somente vislumbrando todo e cada detalhe de uma ambientação impecável.
A névoa dá um show a parte!
Seja escondendo os perigos adiante ou dando aquele ar de solidão que só um jogo de Silent Hill consegue nos proporcionar, ela, com certeza, deu muito trabalho aos desenvolvedores, que estão de parabéns na missão. Especialmente em certos momentos quando a névoa se intensifica, vamos dizer que são momentos em que o jogo se torna mais urgente.
"Eu recebi uma carta. No envelope dizia… "Mary", o nome da minha esposa."
Em Silent Hill 2, você joga como James Sunderland. Um cara comum, com um trabalho comum que outrora tirou férias com a sua esposa na cidade, mas agora ele retorna ao seu "lugar especial" após receber uma carta de sua falecida esposa, que morreu faz três anos.
O jogo começa com James na frente de um espelho em um banheiro de estrada. Sua feição com um misto de confusão e medo. James não sabe mais o que é real ou não. Como pode sua falecida esposa lhe escrever uma carta o pedindo para se reencontrar com ela em seu lugar especial?
Ao sair do banheiro, James pondera sobre o que isso tudo pode significar. Ele já não sabe mais se está louco ou se isso faz algum sentido. Mas de uma coisa ele tem certeza: Ele não vai parar até descobrir.
Descendo pela colina silenciosa, você, assim como James, sabem que estarão descendo rumo ao seu subconsciente e não há retorno!
"Você… eu… somos todos iguais. É mais fácil apenas fugir!"
Apesar de ser uma trajetória solitária, nós não estamos sozinhos nela. Encontramos alguns rostos que nos ajudam a ter uma melhor perspectiva do que está acontecendo.
Outros personagens com seus próprios interesses, ambições e traumas pintam a cidade vazia.
Como Angela Orosco, uma menina misteriosa abalada por seus traumas, que vaga a cidade enevoada em busca de sua mãe. Ou Laura, uma pirralha ranhenta que de primeira só serve pra fazer você odiá-la. Maria que é estranhamente um retrato idêntico, porém oposto de sua esposa, Mary. E Eddie, um cara estranho e medroso que te causa uma estranheza logo de cara.
Todos esses personagens podem ser considerados como aspectos de James, seu trauma, sua inocência, seus medos e seus desejos. Nenhum aspecto da história é por acaso, ou pra preencher alguma lacuna, tudo tem um porquê e um motivo específico de ser como é. Isso é o que me faz amar tanto, não só a franquia, mas o segundo jogo em específico.
"Anda anda, rabisca rabisca…"
Vamos falar da exploração.
Se tem uma coisa que eu amo em jogos são seus mapas imersivos e únicos. E Silent Hill tem os melhores mapas! Eu simplesmente amo checar literalmente tudo pra ficar marcadinho no mapa, até as portas que eu já sei de cor que não abrem!
Agora, James anota os pontos de interesse em tempo real enquanto caminha, um detalhe pequeno, mas que faz toda diferença pra imersão. Em um jogo onde se perder é fácil, um bom mapa é essencial pra navegação, marcando pontos de interesse ou itens deixados para trás para serem coletados posteriormente, já que o jogo tem um backtracking muito bom, sem se tornar cansativo, com exceção da parte da Prisão Toluca e o Labirinto, que não chegam a ser maçantes, mas podem ser cansativos em algumas partes pois estão bem mais amplos que no original.
O combate, por sua vez, é lento porém eficaz. Com foco no embate mano a mano, você não vai querer ser encurralado por dois ou três inimigos. Você com certeza irá morrer!
Os recursos são bem abundantes, mas a estratégia de saber quando gastar munição matando um inimigo ou apenas fugir ainda é sua melhor amiga. Especialmente explorando as ruas da cidade onde os inimigos são mais dispersos e tem certos lugares que não vale a pena gastar seus recursos.
O jogo conta com um total de três armas de fogo e duas armas brancas. Você conta com uma pistola, com dano médio e que foi facilmente minha arma principal. Uma escopeta, potente porém com munição um pouco escassa e um rifle extremamente forte, mas com uma mira péssima e pouquíssima munição.
Você também tem à disposição o cepo de madeira, que é a sua primeira arma e defesa contra as criaturas perturbadoras no jogo e posteriormente um cano de aço, que servem para liquidar os inimigos depois de derrubados.
Certamente um dos grandes diferenciais deste remake é a possibilidade de quebrar os vidros e janelas de carros, lojas e armários. Quantas vezes eu me esquecia da vida enquanto depredava uma vitrine de uma loja ou um carro de polícia atrás de recursos. Foi sem dúvidas um modo genial de espalhar recursos pela cidade sem que fique várias munições largadas pelas ruas (o que nunca fez o menor sentido, convenhamos. Porém, passamos o pano nosso de cada dia).
Enigmas e os vislumbres do passado.
Grande parte do público ficou apreensivo quanto aos possíveis cortes e mudanças na história.
Arrisco a dizer que 90% da história se manteve intacta, inclusive com cenas extremamente iguais ao original, incluindo falas. Mas as poucas coisas cortadas ou modificadas ainda têm sua vez no Remake. Chamadas de "Vislumbres do Passado", são momentos em que o jogo captura uma cena, cenário, item ou enigma existente do original em que foi modificado. Quase como uma forma de dizer ao jogador "Viu só, não nos esquecemos disso!"… e eu AMEI!
Outro ponto que vale ressaltar são os puzzles. Estes que mesmo se mantendo fiel ao jogo original, mudam em alguns aspectos, seja sendo encontrados em locais diferentes, como o clássico puzzle do relógio, antes encontrado nos apartamentos Woodside, e agora pertence ao prédio vizinho, os apartamentos Blue Creek. Alguns mantêm até a mesma resolução que o clássico, outros mudaram completamente e alguns estão sim ausentes, mas não inteiramente cortados. Agora dão as caras como novos puzzles que servem como boa ajuda narrativa e agregam muito à experiência e ambientação.
"Nosso lugar especial…"
Eu tenho uma certa dificuldade em escolher meu cenário favorito do jogo, eu amo ele por inteiro. Mas se for pra escolher um, acredito que seja o Hospital Brookhaven. Eu sempre tive pira por cenários de hospitais em jogos, sempre evocam um sentimento estranhamente perturbador porém calmo e etéreo. E com Silent Hill não seria diferente!
Amo aqueles corredores escuros, com uma ou outra luz acesa falhando, revelando as enfermeiras mórbidas pela penumbra e cenários decrépitos. As salas e quartos contando as histórias de seus pacientes e internados. Uma das poucas ocasiões em jogos que uma ambientação conta mais história do que um diálogo ou arquivo.
"Ele está atrás de mim! Eu sei que está… o demônio vermelho!"
Agora, falando um pouco sobre as ameaças encontradas durante o jogo.
Apesar de poucos inimigos espelhados pelos cenários, cada um apresenta um grau de perigo diferente. Aqui você não vai enfrentar hordas de criaturas ou chefões gigantescos e colossais. Os perigos são bem mais intimistas, o que não significa que não são perigosos.
Sejam os inimigos comuns como os Lying Figures, chamados de "criaturas prostradas", as Enfermeiras Cabeção (kkk que nome tosco, eu amei) ou o Pyramid Head, conhecido como Demônio vermelho ou "Red Pyramid Thing". Cada inimigo tem seu modo de enfrentar. As batalhas contra os chefes, que são poucas, estão bem melhores aqui, mais bem desenvolvidas.
Especificamente uma que não vou dizer qual, mas no original era completamente ridícula, aqui ela está reformulada e bem melhor.
Aqui os manequins fazem seu retorno bem mais desafiadores e perigosos do que nunca (malditos bichos desgraçados).
Você nunca sabe se é seguro entrar em algum cômodo, pois quando menos espera, toma um coice de mula na cara. Sempre que puder, mete bala nessas pragas!!!
Silent Hill nunca teve seu foco no combate, de fato, o combate nada mais é do que uma maneira da cidade te colocar para enfrentar teus medos e traumas. Os inimigos estão ali para atrapalhar seu caminho, com uma certa exceção, que na verdade parece mais te ajudar.
"Jogue como se fosse 2001!"
A trilha sonora é um espetáculo a parte! Akira Yamaoka retorna refazendo toda a sua trilha original, agora mais amadurecida e melhor produzida, não necessariamente significa estar melhor que no original, pois houve momentos em que ainda prefiro algumas músicas clássicas. A remixagem das músicas com os demais sons do jogo também deixou a desejar em certos aspectos, as vezes sentia que a música tinha saído para dar uma volta e já voltava. Isso melhora e muito ao colocar todos os volumes, com exceção das músicas na metade (sugestão do vesta do James — o do site, não o do jogo). Faz com que sejam mais proeminentes e impactantes na ambientação, algo que sinto que deveria vir já como padrão.
Destaque para algumas músicas refeitas como a Theme of Laura e a Promise (Pragma Version) que são as minhas favoritas.
"Outras vozes, mesma essência!"
Apesar das vozes originais serem totalmente icônicas, os dubladores fizeram um trabalho primoroso no remake. Destaque para o Luke Roberts, que dublou o James Sunderland. Não só dando um ar de mais realismo e emoção ao personagem, como trazendo uma das interpretações mais emotivas na franquia.
Enquanto nas vozes originais as vezes parecia muito caricato ou estranho, esse era um certo charme que contribuiu muito com a estética de estranheza do jogo. Porém com vozes mais realistas e emotivas, conseguiram captar bem a aura e essência dos personagens sem perder esse traço de estranheza. Alguns momentos e cenas ficaram aquém do original, talvez seja muito saudosismo da minha parte, mas sinto que poucos momentos não me evocaram o mesmo efeito e emoção que o jogo original de 2001 me evoca até hoje. Mas esse não é bem um demérito, são observações que precisamos pontuar.
Considerações Finais.
Eu só posso dizer que fico muito feliz do quanto eu amei e aproveitei esse jogo maravilhoso como eu fiz. Tinha meus pés atrás depois de alguns trailers duvidosos (pra dizer o mínimo) que foram mostrados e todo o trabalho de marketing do jogo que foi quase inexistente também não ajudou muito. Mas o produto final certamente excedeu e muito as minhas expectativas.
Não só fui levado de volta pra aquele lugar que eu amo, conheço e morria de saudades, como as surpresas foram super bem-vindas. Foi como ir visitar a sua cidade natal e descobrir que ela está melhor do que nunca, porém ainda remete ao gostinho da sua infância.
Eu só tenho a agradecer ao Bloober Team por todo o empenho nesse projeto e mal posso esperar para ver o que o futuro nos trará.
Bloober, vocês me fizeram feliz!
Nota: 10/10
Não quer dizer que o jogo não tenha seus defeitos, como todo jogo tem, mas significa que os poucos defeitos encontrados não diminuem a grandiosidade do que é essa obra, muito menos impactou no meu aproveitamento.